Explicação n.º 11 - Pior cego é aquele que não quer ver

Caríssimos, cá estou eu de volta para com a minha eloquência e sabedoria vos ajudar a perceber muitas das expressões do quotidiano lusitano. No fundo, ajudar-vos a ver com outros olhos, uma vez que temas como os abordados aqui não são ainda abordados nas escolas deste país e nas casas, quando o são, geralmente são mal explicados, para grande infelicidade minha.
Para explicar a expressão de hoje, de índole oftalmológica, recuarei ao ano de 1742, altura em que a até então padeira Gertrudes Matos descobre o seu verdadeiro dom, visto os pães nunca terem enchido as medidas dos seu poucos fregueses. Dizia eu, que tinha, então, por fim, descoberto o seu magnífico dom: ser, como chamam os nossos amigos brasileiros hoje em dia, garota de programa. Porém vendo mais além decidiu apostar num nicho: os invisuais, numa decisão que as más línguas atribuíram à falta de confiança em si própria. A verdade é que soube apostar num nicho, especializou-se, era mais que um cão guia mas ao mesmo tempo menos que uma acompanhante de luxo (binómio difícil de explicar e medianamente complexo de imaginar).
Bem, empolgo-me com os pormenores e distraio-me sobre o que me traz aqui. A Gertrudes o negócio corria-lhe bem. Gertrudes, contudo, começava a queixar-se da falta de tempo, pois não quis nunca largar a panificação, e viu-se obrigada a um dia ter de excluir da sua agenda um encontro com um invisual para que o pão com com chouriço do dia não ficasse comprometido. Aquando da decisão de exclusão, Gertrudes teve de definir critérios e enunciou à sua ajudante: "O pior cego é aquele que não quero ver". Tendo a sua ajudante pergunta "O pior cego é aquele que não quer ver?", "Sim" respondeu a padeira/acompanhante/guia. Não sei se outro cego com um espírito mais filosófico terá ouvido apenas a parte final da conversa ou se por mera erosão linguística, o "o" de "quero" caiu e alguém concluiu que "o pior cego é aquele que não quer ver"... profundo, sem dúvida... Porém, incorrecto! O pior cego foi então o preterido por Gertrudes naquela triste tarde de Outono.

Até hoje não se sabe em quem recaiu a escolha de Gertrudes, contudo gosto de pensar que não foi por meras razões estéticas, sempre gostei de pensar que o pior cego é aquele que é o maior, e passe o termo, filho da puta. Perdão.

Explicação n.º 10: Dar o cu e oito tostões

Pois é, meus caros, cá estou eu de volta. Ou melhor, meus amigos. A bem da verdade, deixem-me que vos diga que, embora o tempo quente que se tem feito sentir, já sentia falta do vosso calor. Esta manifestação de saudades mostra um lado meu mais sentimental, que contrasta com aquele meu lado mais preciso e objectivo revelado ao longo dos posts anteriores. Talvez atraiçoado por este sentimento que dizem ser tão lusitano, faço hoje um post sem reunir todos os dados que considero imprescindíveis. Espero contudo que não me levem a mal. Na verdade, embora saiba a história que está por trás desta expressão, não sei a época em que isto ocorreu. Assim sendo sem qualquer referência temporal conto-vos a história da Senhora Dona Almerinda Custódio, esposa de Américo Custódio. Américo, ávido jogador, desde cedo comprometeu as finanças familiares com apostas sempre nos cavalos errados.
Almerinda vivia preocupada com o desgoverno que reinava dentro de sua casa. E ao segundo dia que o Jaiminho (nome pelo qual era chamado o seu mais novo) reclamou por pão, Almerinda decidiu vender o seu próprio corpo na esquina mais próxima. Trágico para uns, oportunidade interessante para outros. Os valores que pagavam na altura eram tentadores e se por felátio, as alcoviteiras da altura recebiam 15 tostões, cada sessão de sexo anal chegava a atingir a soma de 20 tostões. Uma fortuna para a época. Nem tudo são rosas, porém. A concorrência na altura era alta e muitas vezes Almerinda chegava a casa com os bolsos vazios. É assim que Almerinda, inspirada pelo gosto que sempre lhe deu o sexo anal, fazer uma promoção. Por cada 20 tostões que lhe dessem, ela dava o "cu" e ainda dava o troco de oito tostões. Uma pechincha estes 12 tostões dado o talento natural da senhora. E foi assim que nasceu esta expressão que deriva do gosto desta alcoviteira pelo sexo anal. Dar o cu e oito tostões é então utilizado para expressar situações que uma pessoa esteja a querer muito algo.

Explicação n.º 9: É de se lhe tirar o chapéu

Escrevo hoje sobre esta expressão visto uma admiradora minha utilizá-la amiúde, a meu ver, de forma aleatória sem saber claramente quando empregá-la.
A história que vos conto tem no seu centro o senhor Robert-Houdin, ou melhor dizendo, Monsieur Robert-Houdin. No inicio do século XVIII nascia em França o menino Jean Eugène, nos genes tinha a profissão de relojoeiro como destino. Mas quis este pregar-lhe uma partida e num dia em que ia comprar mais livros sobre relógios, quando chega a casa depara-se com o seu (feliz) engano. O livro que tinha comprado era, pois então, um livro de magia.
Jean Eugène Robert-Houdin poderia ter dado até um relojoeiro dedicado, mas naquele momento nascia ali aquele que viria a tornar-se no pai do ilusionismo moderno.
Mantendo a sua profissão de relojoeiro, Robert-Houdin foi aprofundando os seus conhecimentos na arte do ilusionismo e com a ajuda do seu primo afastado Pierre Eugène (o apelido não me recordo) lá foi fazendo espectáculos para os seus familiares e mais tarde já para os seus vizinhos.
Todavia, Houdin dispensaria o seu primo... Por razões ainda hoje desconhecidas.
Perante o incentivo dos seus, e já depois deste triste episódio que acabaria com uma amizade de berço entre primos, Houdin ganha alento e vai para a metrópole parisiense, onde acaba por comprar um teatro.
Num dos primeiros espectáculos com o público já em autêntico gáudio perante tanta "magia", quem é visto na plateia? Pois é, meus caros amigos, o Pierre. O Pierre que sabendo todos os truques, levanta-se impulsionado pelo desejo de vingança que lhe corroía e apontando para o seu primo diz: ESTE HOMEM É DE SE LHE TIRAR O CHAPÉU! O público empolgado com todo o espectáculo  ao ouvir estas palavras não pensa duas vezes... levanta-se e tira o chapéu, não percebendo que os truques que todos viam tinham sido denunciados e na realidade o coelho não brotava do polegar de Houdin, vinha sim da sua cartola.
Nascia assim o mito nesta Paris do séc. XVIII que "é de se lhe tirar o chapéu" era uma expressão usada perante algum feito notável de alguém. O mito dura até hoje.

Explicação n.º 8: Afogar o ganso

Primeiramente terei de referir para que ninguém se escandalize, este blogue nasceu com o propósito de esclarecer e não se pode compadecer com falsos pudores
Expressão aparentemente de índole ornitológica, nascida no Brasil, num vilarejo a norte do estado de Piauí. Sem rodeios, vos digo: nesse país irmão atribuem o nome de pinto ao órgão sexual masculino desde há muito, muito tempo. Reinaldo, desconfortável com o nome de franguinho pequerrucho dado ao seu maior motivo de orgulho,  exigiu à sua senhora que caso ela quisesse continuar a tratá-"lo" pelo nome de uma ave, ao menos o denominasse de ganso - ave já maiorzita e com pescoço considerável. A esposa de Reinaldo assim o fez. Rapidamente este conceito se espalhou pelo Estado e depois até por todo o Brasil. (Embora em muitos Estados apenas se atribuísse esta designação, conforme o estado de entusiasmo)

No que toca à expressão "afogar o ganso" propriamente dita, deixem-me partilhar convosco a história de um ourives que certa vez faz o pedido à sua mulher, Roberta, nadadora salvadora de profissão, para que esta lhe afogue o ganso. Esta, ciente das operações de salvamento de um afogamento e curiosamente nascida e criada algures no Piauí, não tem meias medidas e  começa a fazer respiração boca a boca... no "ganso".
O ourives deliciado com o talento dela acaba por decidir nunca lhe contar que esta expressão que significa coito tem origem na China maoísta, quando os chineses aliviavam as suas frustrações nos pobres coitados dos gansos e segundos antes de ejacularem, os homens afundavam a cabeça da ave na água, para poderem sentir os espasmos anais da vítima (aproveito para esclarecer que sou contra qualquer tipo de zoofilia, mas guio-me pela verdade e é essa que vos conto. Os animais são nossos amigos. Sim, são. Mas pára por aí - é um conselho que dou às pessoas que vejo com cara mais pervertida).
Desta forma, repito, "Afogar o ganso" significa coito e não felácio como a senhora dona Roberta pensava. 
Ao senhor ourives caso ele esteja a ler, os meus sinceros pedidos de desculpa por qualquer problema conjugal que este artigo lhe possa causar. Mas eu escrevo neste espaço com sentido de missão. E a minha missão é esclarecer.

Explicação n.º 7: Dar água pela barba

Bom, hoje terei de começar com uma pequena historieta à parte da explicação desta expressão. Em 2007, num jantar de confraternização de historiadores ocorrido em Fornos de Algodres, enquanto comia a minha panna cotta estive à conversa com outro nome conhecido desta área, Benjamim Veríssimo. Um dos temas abordados, além das hérnias que o apoquentam, foi mesmo esta expressão. Dizia Benjamim que esta expressão decorria de uma transacção comercial ocorrida amiúde nos mercados de Pequim... Meus amigos, nada mais falso que isto. Isto a meu ver é história contrafeita. Tudo isto para vos dizer o quê? Tenham cuidado com o que lêem por aí, nem tudo tem o meu selo de qualidade e veracidade .
Passado este preâmbulo, vamos então ao que realmente interessa e ao que vos faz vir a este site. A busca de respostas. E aviso-vos esta expressão tem origem bíblica!
Estamos em pleno Egipto numa altura em que o Faraó Seth, ressabiado com o aumento do número de escravos, todos eles hebreus, ordena a execução de tudo o que é bebé dessa origem. Corria o longínquo ano de 1592 antes de Cristo, quando Dona Joquebede dá à luz o seu rebento. Não querendo para ela o trágico destino que o Faraó ordenou a todos os seus semelhantes, esta escrava decide colocá-lo numa alcofa e lá vai ele Nilo abaixo até que é encontrado pela filha do Faraó que o acaba por educar. Falo, pois está claro, de Moisés. Toda a história de Moisés é conhecida por vós e quem não a conhece não pode esperar que eu lhes conte aqui tão rica história.
No entanto, o episódio que agora vos conto é do conhecimento de todos nós. Aquando da libertação do  seu povo, o povo israelita, da tirania e opressão do Faraó, vê-se encurralado por este. Não tem alternativa senão atravessar a nado o Mar Vermelho. Nesse momento, ainda esperançado com a pouca profundidade das águas, pergunta a um senhor que se encontrava a pescar: o senhor sabe por onde dá-me a água, meu caro? 
Enquanto o peixe não mordia o isco, o senhor responde depois de tirar as medidas a Moisés: A si...? Bom, a si a água dá-lhe pela barba.
Moisés pensou que a nadar teria então muito trabalho pela frente. E desde então "dar água pela barba" significa "dar muito trabalho". O resto da história é conhecido, ao contrário do que se poderia pensar não foi necessário nadar, tal como se sabe, a divisão das águas ocorreu, o povo de Israel conseguiu fugir aos egípcios, que tentando o mesmo acabaram se afogando.

Explicação n.º 6: "dar o peido mestre"



Pois é, meus caros, hoje mais uma curiosa história me volta a unir a vós, aposto que, ávidos da minha leitura. A expressão que vos trago hoje é "dar o peido mestre".
Encontramo-nos em pleno reinado de D. Fernando. D. Fernando, um rei apaixonado, é prometido a D. Leonor de Castela, mas o rei queria mais, nunca se sentira atraído pelo nariz considerado "estranho" da nobre espanhola. Assim, num acto de loucura próprio de uma grande paixão,  antes que o seu casamento pudesse ser concretizado, o rei confessa todo o seu ardente amor por  D. Leonor Teles de Menezes, mulher de um dos seus cortesãos. Após a rápida anulação do primeiro casamento de D. Leonor, D. Fernando casa com ela, secretamente, a 15 de Maio de 1372 no Mosteiro de Leça do Balio.
Nos primeiros tempos, tudo corria bem, e a vida sexual do nosso rei era comentada além fronteiras, no entanto com o passar dos anos durante as breves aparições públicas do casal, era notório que enquanto o sorriso do rei ia diminuindo, o da rainha ia crescendo de orelha a orelha. O rei começou a ficar sisudo e diz-se que de forma a aliviar as suas necessidades mais primárias  não mais prescinde da presença de um dos seus lacaios, de nome David, jovem de apelido desconhecido. 
Após a morte de D. Fernando, a sua viúva D. Leonor Teles de Menezes, que perante as vontades de rei socorria-se sempre de uma nobre dor de cabeça, aproveitou a morte do marido para tornar pública a sua ligação amorosa com um nobre galego João Andeiro.
Portugal, num impasse perante a iminente perda de independência (visto, a única filha de D. Fernando, D. Beatriz ter-se casado pouco antes da puberdade com  João I da Castela), vê a 6 de Dezembro de 1383 Mestre de Avis, numa atitude que muitos julgavam populista pois era um dos pretendentes ao trono, a assassinar o Conde Andeiro. Contudo, esta atitude estava longe de ser populista, era sim passional. O Mestre de Avis atribuiu as culpas da perda de virgindade anal do seu "amigo" David, ao caso mantido pela rainha com o Conde. E assim, a 6 de Dezembro de 1383, D. João, ainda Mestre, já com a espada próxima do corpo do Conde, indaga-o: Vós tendes um último desejo? e o Conde, antes de ver a espada a esventrar-lhe o coração, quiçá de forma irónica responde-lhe, já num português eloquente: "Dar um peido, Mestre!".
Vem então daí a associação desta expressão à morte.

De nada.

Explicação n.º 5: "Parece que pariu para aqui a Galega"

Esta expressão tem como protagonista Maria del Pilar Romero nascida numa terra próxima de Pontevedra, a origem exacta gera confusão. Uns historiadores apontam que terá sido em Mourente, outros afirmam convictamente ter sido em Polo San Salvador. Eu pouco me importo, pois acho que este conflito pouco acrescenta à história (no entanto, não poderia deixar de partilhar convosco, para perceberem toda a controvérsia que esta senhora ainda cria nos dias de hoje).
Maria del Pilar Romero era uma mulher feita quando conhece Joel Fernandes, empresário de texteis da zona de Barcelos. O encontro acontece nos idos anos 40 do século passado numa feira de artesanato em Pontevedra. Foi o que se chama amor à primeira vista, a linda morena de seios fartos encantou de amores Joel. Assim, passados 3 dias, Joel dirigiu-se a casa do pai de Maria del Pilar a pedir a mão de sua filha em casamento.
Joel casou e Maria foi viver para Barcelos. A Maria, para além de muito amor, eram lhe dadas todas as mordomias, próprias do viver de um homem rico, havia "criados" para tudo, era tempo de fartura, faziam-se riquezas na indústria do calçado em Portugal.
Pouco tempo depois de casados, chega a boa nova, o casal espera o seu primeiro filho. Em Maio de 1944, nasce, então, Daniel del Pilar Fernandes. "Preto retinto" foi assim que a parteira o descreveu (n.d.r: Joel era loiro, conhecido como o "ruço" na escola). Escusado será falar na confusão que tudo isto gerou. Joel, de cabeça perdida ao ver a cara de um dos seus "criados" de origem guineense no bebé por ele aguardado durante 9 longos meses, começou a partir tudo o que via à sua frente: cadeiras, pratos, etc e tal...

Desde então, utiliza-se a expressão "Parece que pariu para aqui a Galega" para nos referirmos a uma situação em que o caos está instalado.